segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

Vento, ventania

Ela olhava pra janela...
Já era a décima vez, ou talvez mais, que ela fazia o mesmo movimento: levantava do sofá, se dirigia à janela, olhava pra rua deserta como à procura de algo, virava-se com cara de desapontamento e sentava-se de novo no sofá com o olho vidrado na TV que passava qualquer coisa que ela não saberia dizer.

Qualquer um poderia tentar achar uma explicação racional praquilo. Mas ela não.
O que ela estava esperando não tinha horário marcado e nem tinha previsão de chegada, se um dia chegasse.
O que ela esperava não era uma pessoa, muito menos um acontecimento, era algo mais parecido com um suspiro ou uma brisa leve, quase imperceptível a qualquer um, porém essencial naquele momento.
Ela se lembrou de quando, um dia, tinha deixado as janelas abertas e tinha sentido a brisa leve da manhã entrando na sala, quarto, pulmões e coração. Mas se lembrou também de que nesse dia a tarde não tinha sido tão amiga quanto a manhã. Diferemente da manhã, a tarde não trouxera com ela uma brisa leve, mas sim um vendaval, que destruíra tudo, deixando móveis, objetos, livros e tudo mais jogados pelo chão.
Pacientemente ela se dirigiu pras janelas e fechou todas elas. Depois tratou de arrumar aquela bagunça. A cada objeto colocado no lugar, a cada móvel arrumado, ela se sentia mais desgostosa.
Como é que uma brisa se transformara numa ventania?
Como era possível que algo tão sublime fosse o início de algo tão destruidor?

Agora, com tudo no lugar, ela corre pra janela a cada manhã e tarde.
Espera, inutilmente, descobrir ali, através dos vidros, o que separa o sensível do grotesco.
Mas ela não consegue ver a brisa passar, muito menos a violência do vento.
Ela há muito entendera que não conseguiria ver nada, nunca. A não ser que abrisse de novo as janelas, não para ver, mas para sentir. Mas as janelas continuavam ali, intactas, do mesmo modo como foram deixadas desde a ultima vez em que foram fechadas.
Talvez não lhe faltasse coragem, e sim lhe sobrasse fraqueza.


"Pode até parecer fraqueza, pois que seja fraqueza intão..."
Lulu Santos



Um comentário:

Adrielly Soares disse...

Nossa.
Calma. Deixa eu suspirar.
Tão gostoso, tão sutil.
Adorei.

Precisando abrir minhas janelas
nas horas certas. =~~



;* meliga

Obs: como-você-escreve-cada-dia-melhor-céus!!!