sábado, 25 de julho de 2009

Londres, 24 de dezembro

Essa é mais uma daquelas cartas pra você, mais uma pra fazer companhia aos montes delas guardadas dentro de gavetas e armários, espalhadas por toda a casa. Mais uma pra te contar das alegrias, das saudades, do sucesso e do fracasso. Mais novidades que você nunca irá receber, mas mesmo assim gosto de mantê-las assim num pedaço de papel e acreditar que de algum jeito você sabe de tudo isso que eu escrevo.
Talvez você não saiba, talvez nunca tenha desconfiado o quanto eu me sentia bem quando estava ali com você. Mas era verdade e eu não conseguia demostrar, mas todas as vezes que me olhava, todas as vezes que me abraçava como se não existisse nada além de você e sua vontade de proteger todos de tudo, eu me sentia mais, eu sentia que saía de você tudo o que eu esperava sentir, melhor que isso, eu podia ver nos seus olhos que era verdade e eu podia acreditar, eu podia me deixar levar outra vez entende? E era tudo tão íntimo e natural, as besteiras não pareciam besteiras e ouvir você filosofando qualquer coisa sobre não dormir era a coisa mais bonita que eu poderia escutar naquela hora. E me pegar no meio de uma conversa sobre sair correndo por aí e te ver olhando pra mim segurando o riso, era algo impagável. Durante aquelas tardes eu pensava quanto tempo nós levamos para acreditar em tudo isso, quanto tempo gastamos fazendo as coisas erradas sendo que as certas estavam tão perto.
Não, não tudo isso estava longe de ser amor, mas havia uma coisa de pele. Além disso, havia uma coisa de carência, minha e sua. Eu era a companhia de alguém que não conseguia ficar sozinho e você era quem dava a atenção que eu sempre precisei, a pessoa que me olhava admirado, com valor, com respeito. Nós dois sabíamos porque estávamos ali, sabíamos que cobríamos as necessidades um do outro e era por isso que dava tão certo e era por isso que era tão simples.
Sabe, eu estou perto de chegar a mais um sonho, lembro de você me dizendo que não duvidava que eu chegaria onde quisesse. Engraçado quando todos confiam tanto em você quando nem temos tanta certeza das coisas assim. Eu confiava em você, eu tinha certeza de que um dia eu iria te encontrar passeando numa pracinha rodeado de criancinhas lambuzadas de algodão doce rosa. Típico seu. O super pai. Perto de você eu era mais uma criancinha, mais alguém pra ser cuidada, pra ser protegida. E não era muito difícil pra você fazer esse papel.
Faz dois anos que eu me tornei mãe você sabia? Acho que devo ter te contado sobre Alice em uma das tantas cartas que já te escrevi. Ela é um doce de menina, sabe como convencer qualquer gente grande com aqueles olhos cor de mel. Mas agora é ela que precisa de atenção, é ela que precisa ser protegida. E me dá medo pensar que eu posso não estar aqui quando ela precisar, me dá medo de eu não conseguir protegê-la do jeito que ela precisa. Me dá medo de ela se tornar o que eu me tornei, alguém frágil, amedrontada. Preciso dizer que ainda hoje sinto medo das coisas, ainda hoje sinto saudades dos seus braços ao meu redor, me dizendo que você estava ali e isso bastava.
Mas eu já não posso me dar ao luxo de demonstrar fraqueza, tem alguém ali no quarto ao lado que espera que eu seja a mulher mais forte do mundo. Mas isso eu já estou acostumada a fingir, desde que você foi embora eu me tornei uma muralha e, ainda que casca, sustenta uma família inteira.
Tento imaginar você e suas criancinhas hoje no parque.
Sinto saudades de tudo o que não pude ver.
Qualquer dia desses, esbarro com você numa dessas esquinas.

Com amor,
Clara.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Running away

Antes era um sonho, um querer desalinhado de sair por aí e conhecer o mundo, de sair dessa vida que sempre pedia mais... por mais que já tivesse tudo, ou quase tudo. Antes era quase um capricho, coisa de menina deslumbrada com as belezas que se pode encontrar mundo a fora. Antes era quase conto de fadas, agora é fuga, é medo, é vontade de mudar, de esquecer.
Tô me mudando, me mandando daqui, to atravessando o atlântico pra encontrar o que for que seja do outro lado. O importante é que vou encontrar seja lá o que isso for. E depois... bom, depois eu descubro o que fazer com isso.